domingo, 21 de dezembro de 2014


Estou tão feliz


Não desses momentos efêmeros
Que por vezes atravessavam a minha existência angustiada
Mas numa felicidade que se fortalece dia após dia
Fruto de um trabalho consistente de análise e terapia

Reconciliei-me com o meu passado
Do qual guardava rancores, frustrações e muita tristeza
Não aceitava as minhas qualidades e vivia amargurado
Pelos meus erros, erros que só eu sentia por vezes

Agora, vivo sem culpa este presente
Em que me amo, quando nunca me amei
Sinto uma autoconfiança quase inabalável
E a coragem que nunca tive para ser quem nunca fui

Falo em voz alta, porque preciso de partilhar este momento
Em que me sinto invadido por esta tranquilidade
Uma paz e um bem estar dos quais vos quero contagiar

E reconheço nos vossos gestos, que o vosso carinho
Retribui o modo como amo cada um de vós
Sei o valor de um abraço, conheço o poder de um sorriso
Eles são a salvação na minha solidão

Se fosse ontem certamente não me sentiria tão seguro
Não me verias como este homem que tens diante de ti
Não seria capaz de te amar e não me permitiria o teu amor
Hoje falo de amor e desejo

E os desafios da vida, eu continuarei a levar
Com a determinação com que levo a minha vida
Com esse reconhecimento da sorte que me acompanha
Mas com a consciência que mereço celebrar as minhas vitórias

domingo, 16 de novembro de 2014

Igor


Ele levantava-se todas as manhãs e nem sabia porquê, sabia apenas que tinha que o fazer, tudo era mecânico, uma rotina que o mantinha em segurança.

Novo dia, mais páginas impressas na velha máquina do jornal onde trabalhava. Brigite. Era assim que apelidara a sua colega de trabalho mecânica e com ela passava larga parte da sua existência.

O nome de fabrico parecera-lhe impessoal e bastante comum entre todas as máquinas naquele enorme espaço. Igor conhecia Brigite por dentro e por fora, responsável pelo seu funcionamento, tratava dela como ninguém.

Acreditava que a forma humana como interagia com ela, aumentava o seu rendimento. Não gostava da forma mecânica como era tratado pela organização. Ao conversar continuamente com Brigite abstraia-se e o tempo passava sem tanta dor.

Era seu hábito, ler para Brigite cada pedaço de papel impresso e com ela comentava o que lia, o que pensava. Igor fazia longos discursos e exuberantes intervenções para cada tema. Estes textos eram a janela para o mundo.

Há muitos anos graças a este trabalho, conseguira ganhar o que a infância havia retirado, o direito de poder ler. Lembrava os anos em que sonhava saber ler, quando carregava pacotes da mercearia vendo outros meninos carregando livros.

Seguira este sonho com todas as suas forças, e novo começou a trabalhar no jornal, junto de Brigite. Arranjara o sustento que a família precisava e encontrara o caminho que acreditava ser a oportunidade para aprender a ler.

Longos foram os dias em que não comera. Poupara todo o dinheiro que podia para pagar à professora que lhe ensinava, todas as noites, as maravilhas do mundo das letras. Com muita vontade e sede de conhecimento depressa pode começar a coordenar o que lia com o que entendia.

Distante destes tempos, mantinha a simplicidade com que vivia, as manhãs não mudavam, os gestos e os passos repetiam-se. Chegava perto de Brigite e cumprimentava-a, seguia para o vestiário, vestia o uniforme, forrado de óleo e massa, voltava com a sua caneca de café, pegava na prova para impressão e lia em voz alta.

Porém, naquela manhã tudo foi diferente, não sabia que o mundo iria desabar sobre os seus pés, ninguém o informara. No trabalho, ele não conversava com ninguém, para além de Brigite.

O que lia falava da tecnologia que chegaria em breve. Brigite seria reformada, não era mais rentável. A vida assim não fazia mais sentido. Prostrado e invadido de desalento não conseguia reagir, não comentava com Brigite esta notícia, não queria explicar.

Não era dia de a seduzir com eloquência. Desviava o olhar, mantinha segredo e incomodado tentava escutar o seu funcionamento. Procurava assegura-se da normalidade, mas o seu coração batia forte. Queria poder sair, fugir, pensar. Precisava de tempo, era a sua vida.

Noite de insónia, os pensamentos e a ansiedade invadiam-no. Sabia que ele, tal como Brigite, eram de um tempo diferente deste que surgia, que crescia em seu redor. Não sentia nem força, nem vontade de o acompanhar. Desejava poder terminar a sua vida trabalhando perto da sua companheira.

No jornal, Igor era estimado. Longe das invejas e jogos de poder, mantinha-se discreto e desta forma, os anos haviam passado tranquilamente. O seu estado de espírito passava sempre desapercebido a todos os colegas. Era o que desejava perante toda esta agitação que sentia, e refletir-se-ia somente na sua relação com Brigite. Ele teria de continuar fingindo que nada se passava.

Igor não sabia ao certo o que fazer, como poder demonstrar que apesar de ultrapassada, Brigite era parte de uma história, representava uma época em que os jornais também puderam ser impressos.

Aceitava o progresso e lembrava-se perfeitamente de ouvir falar no choque que Brigite tinha causado quando chegara ao Jornal, vinda de fora e acompanhada de meia dúzia de técnicos para a montar e a colocar em funcionamento. Brigite havia sido naqueles tempos, o reflexo de uma nova era. Agora o ciclo voltava a passar pelo jornal.

Os dias passaram e o trabalho continuou com normalidade. A rotina tinha acabado por devolver Igor aos seus comentários, a que Brigite respondia com os sons surdos das correntes e dos rolamentos. Nesse diálogo entre homem e máquina, surge numa manhã o Patrão que, de tempos em tempos, gostava de contemplar Igor e Brigite.

O Patrão raramente falava, apenas se sentava a ouvi-los enquanto meditava. Ambos haviam criado uma empatia, baseada nessa cumplicidade de dedicação ao jornal. Apesar de representarem dois lados distintos da organização, ambos se entregavam ao trabalho por gosto pessoal. E contrariando a regra, eis que que o Patrão pergunta a Igor.

Patrão – O Igor sabe das mudanças que estão para chegar ao jornal?

Igor – Sei sim Senhor!

Patrão – O que pensa disso?

Igor - São os sinais do tempo, temos de acompanhar o progresso para continuar presentes. Nem eu nem Brigite fazemos mais parte desta nova realidade.

Patrão – Eu sinto o mesmo, esta transformação chegou para me libertar.

Igor – Senhor, o que conheço do mundo é o que sai deste papel impresso. Tudo o que aprendi foi aqui neste lugar, agora restarão as memórias.

Patrão – Igor, conto consigo para me ajudar a preservar essa memória.

Os dias que se seguiram passaram em alvoroço, chegaram desta vez mais técnicos e engenheiros, avaliaram o espaço desmontaram máquinas, levantaram paredes, reformaram o espaço para a nova realidade. Igor e Brigite mantiveram-se presentes, Ele assistia curioso ao processo, enquanto o seu espaço era igualmente recondicionado.

Mais tarde ficaram isolados da linha de produção e o som das máquinas foi substituído pelo som de perguntas curiosas de criança e adultos que fascinados visitavam este museu vivo. Igor sorria, enchia os pulmões de ar e mantinha a sua rotina com Brigite, a estrela, a sua amiga.

Anos depois Igor morreu. O Patrão sabia que Brigite precisava de sentir a presença de Igor para a eternidade e mandou instalar uma tela para projetar os filmes que colecionara durante a vida.

sexta-feira, 26 de setembro de 2014


Boa tarde,
 
A ausência não significa silêncio! Percorro os dias e o tempo com este corpo que não me abandona, vivo com ele experiências fabulosas.
Terminei recentemente o meu primeiro projeto literário, impulsionado pelo desejo ardente de iniciar um novo. Esta energia contagia a minha visão da vida, a minha forma de agir e me relacionar.
Quero agora contar-vos umas histórias, que irei publicar neste espaço, para depois compilar num livro. A ideia começou deste modo...
 
Os Inadaptados

A sociedade define padrões, a religião postula costumes e a humanidade conduz a valores, mas ainda assim existimos e vivemos, sentindo-nos desenquadrados dos parâmetros definidos para a generalidade dos homens, mulheres, crianças e velhos.

As nossas diferenças enfraquecem-nos perante a força da intolerância e ignorância. A nossa fraqueza não é tolerada neste mundo em que a afirmação se faz com brutalidade e agressividade.

Os inadaptados não resistem contra a mudança nem perante a opressão, apenas são eles mesmos, não têm força ou vontade de lutar, querem simplesmente existir nos seus mundos, que partilham com pessoas que não julgam, não condenam e aceitam que toda a gente tem direito à diferença.

Os inadaptados, sou eu, és tu, somos todos nós que nos revemos nas nossas singularidades, nos nossos comportamentos, na nossa tristeza, nesta solidão que acompanha a certeza de uma vida especial.

Quando eu morrer tenho um desejo, porventura desmedido, mas como só vou morrer desta vez, aceitem-no como um capricho. Pensem em mim com carinho e sorriam.

Construí a minha vida, embalado pelo vosso afeto que me ajudou a suportar a aridez da indiferença.

Tentei sempre afirmar a minha gratidão, o quanto me sensibilizava um abraço, um beijo, um simples oi, olá, um tudo bem.

Pequenos gestos que me animaram, que cultivei, que me fizeram sentir vivo.

Se as emoções calaram a minha voz, as lágrimas apagaram as minhas palavras, estou certo que um gesto vos retribuiu.

Se mesmo assim, tal não aconteceu, dedico-vos o meu pensamento neste texto.

 

sábado, 13 de setembro de 2014


Desafio cada instante da vida,

Não sou um aventureiro destemido,

Não sou atleta dedicado,

Sou um sonhador.

 

Conheço a dor e a tristeza,

Vivi paixões, sofri desilusões,

Corro por tudo o que acredito

Confio na pureza das palavras

 

A loucura ajuda-me a filtrar o que não quero

Vejo através do coração, o que se esconde da razão.

Num olhar revelam-se desejos

Em gestos falamos segredos

 

Sigo o tempo que não para

Que nos consome num crescendo de atenção

Que não conseguimos acompanhar

Esquecemos as nossas próprias vidas

 

Um abraço será sempre um abraço

Um beijo não deixará de ser um beijo

A lágrima cairá do rosto que chora

O sorriso brilhará nos olhos de quem o receber

 

Mas é possível parar para amar,

Para olhar o voo do pássaro,

Escutar o som do mar,

Para gritar eu estou aqui!

quarta-feira, 10 de setembro de 2014


O Homem Máquina


 

O meu corpo já não termina nos meus dedos,

Pois eu nada sou sem o carro com que me desloco,

Sem o telefone com que comunico ilimitadamente.

 

Já não sei viver sem toda a parafernália eletrônica

Que acompanha a minha existência e que

Quando param, eu desespero.

 

Carrego-me de combustível e de energia,

Pois o meu corpo exige novos alimentos,

Transformo-me mas ainda distante do óptimo.

 

Sonho poder mutar o meu corpo,

Instalar sem pudor as máquinas que carrego

E me atrapalham hoje os movimentos.

 

Um dia vou ter chips e telefones embutidos no corpo,

Conexões, wi-fi e baterias eternas,

Vou poder voar em vez de andar.

 

E não me falem dos contras!

Eles acompanham a evolução,

Os desafios são eternos.

 


Desejo desejar e ser desejado

num universo de desejos infinitos,

em que me perco na vastidão da minha ilusão,

onde a vontade é o meu limite.

 

E o tempo será essa miragem,

relógios parados,

dimensão que se mede por impulsos

e não em segundos.

 

Caminho sem gravidade,

não tenho peso próprio,

libertei a âncora que me

mantinha na outra dimensão.

 

Aqui, transito pela liberdade

respiro perfumes hipnóticos,

alimento-me de frutos que nunca comi

sorvo todos os momentos da vida.

 

Não sei se é felicidade,

nem importa, pois procuro sentir

a magia irreal do sonho,

doce, esta alucinação.

 

domingo, 7 de setembro de 2014


Vem,


 

Hoje acordei triste, não te encontrei

Quisera te tocar, te sentir, te ouvir

Passar a manhã agarrado a ti

 E embalar-me no teu cheiro.

 

Acordei e estava só, a cama deserta

E fiquei pensando porquê, não descobri,

Mas o sentimento perdurou, continua ainda,

Pois sei que logo vou adormecer embalado

Nesse sentimento, nesse vazio que não venço.

 

Não é difícil encher uma cama, mas não é simples,

pois um corpo vazio de emoções me traria

Maior sofrimento que este que sinto sem ti.

 

Tu me trazes o conforto que procuro ao te abraçar,

tu tens a magia de me cativar, tens o dom de me seduzir e

é por ti que a minha cama espera vazia.

 

sexta-feira, 5 de setembro de 2014



Se eu fosse um animal seria sem dúvida um homem, pois não sei viver na água e no ar.

De todos os objetos, o melhor é certamente a cama, a minha ou a tua.

A apatia é a cegueira dos sentimentos, vazia e distante como o eco.

A loucura é um sinal de vida e o reflexo da dor insuportável.

Um sorriso apazigua a minha inquietação, acelera o meu coração e traz felicidade à minha vida.

A perfeição não existe, porém a busca dela é a mais perfeita de todas as aventuras.

Não existe passado, presente e futuro, tudo é eternamente efémero e se contrabalança constantemente nas minhas ações e emoções.

Nunca me consegui entender, sei que preciso de ajuda, o meu reflexo em vós é a imagem que tenho de mim. Só, eu não sirvo de nada.

A amizade é a conquista mais valiosa que já consegui. Não sei qual será a minha maior derrota.

 

quinta-feira, 4 de setembro de 2014


Desejo a tua pele, tocar-te, sentir como é macia, beijar e respirar o teu perfume.

Quero abraçar-te e envolver-te nos meus braços, os nossos corpos ligados por milhões de poros, um gostoso arrepio e um intenso desejo.

Percorro o teu corpo fascinado pelo seu esplendor, doces caricias, beijos suaves, gosto de te ouvir gemer nesse momento.

Dos pés que massajo com imenso prazer, passo as minhas mãos pelas tuas pernas centímetro por centímetro, a minha língua segue atrás te saboreando e degustando.

Envolvo o teu peito pelas minhas mãos, trinco os teus mamilos, tu gritas o meu nome. Na minha boca tenho a tua língua que, junto à minha se entrelaça, num jogo que não finda.

Aperto com força a tua bunda enquanto sentada sobre mim te penetro e estremeço contigo neste clímax em que gozamos e nos amassamos.

Ofegantes nos deitamos no deleite deste prazer consumado, nos acariciamos, sorrimos felizes, o tempo parou lá fora, o universo está neste quarto partilhado, nessa cama, no teu corpo nu perto do meu.

O teu nome é mulher, o teu cabelo tem as cores do arco íris, os teus olhos mudam sempre que piscam para mim. Beijas-me suavemente, tratas-me com doçura, és meiga e sensual. Tens o tesão que me excita e o mistério que me mantém cativo a ti.

 

Tu és especial!


 

A conversar te conheço, tu te revelas e eu te escuto encantado.

Contas-me histórias novas que nunca ouvi, vidas e experiências que desconhecia e assim enriqueces a minha existência.

Adoro este privilégio de partilhar a tua vida, entrar dentro de ti, dar parte de mim.

Como é deliciosa e ávida esta vontade de tudo saber, este desejo de sugar, comunicar, esta tranquilidade de estar junto de ti e sentir que tudo parece real.

Em simultâneo, construímos também os nossos próprios momentos, felizes constatamos afinidades e sorrimos.

As horas passam e estamos viciados um no outro, tudo nos cativa, tudo é inspiração, envolvemo-nos nesta atmosfera que já transcende a empatia.

Tudo me interessa quando me falas de ti, gosto de saber o que pensas, o que sentes. As tuas emoções asseguram-me que sofres como eu, do gosto de viver com sentimentos.

Somos demasiado parecidos e nos assustamos, tudo é repentino, tão intenso que nos abraçamos sabendo que os corações batem aceleradamente.

Maravilhados nos rendemos à felicidade do acaso nos ter cruzado. Um encontro é sempre uma combinação de coincidências que se assemelham ao acaso.

Como é magnífico o poder dos estímulos que provocam arrepios cada vez que nos sentimos mais próximos, nessa certeza de estarmos conquistando uma grandiosa amizade.

 

quarta-feira, 3 de setembro de 2014



O que quero eu realmente? viver de sonhos, criar ilusões, amar tão loucamente e morrer tranquilamente.

Quero poder correr por desejos, combater os meus demónios e sentir que vou em frente neste caminho tão sinuoso.

E escrevendo vou levando a minha vida, pensando e sentindo, não escondo sensações e emoções.

Através de mim, falo de pessoas, de coisas comuns, de inquietações, de hesitações.

A minha escrita é a vida intima, a transposição de segredos, a nossa essência.

 

Aeroporto

 

Lugar de passagem para essa viagem que desafia a gravidade.

Voos que se cruzam, embarques, desembarques, pessoas cansadas, pessoas felizes, pessoas que falam tantas línguas diferentes.

Caminham de um lado para o outro, uns devagar, outros em passo largo.

Sentadas em cadeiras desconfortáveis estão espalhadas as que se perdem nos seus pensamentos, nesta espera necessária que cria ansiedade.

Pessoas sós, silenciosas nas suas vidas, grupos barulhentos depressa passam levando com eles o ruído.

E o tempo não passa, esgotam-se as atividades, repetimos gestos, prendemo-nos ao infinito, repousamos o pensamento da chegada.
 

quinta-feira, 21 de agosto de 2014


Sedução

 
Represento para ti a figura que desejo ser e busco em ti a imagem que me atrai. Tu fazes o mesmo.
A sedução é a arte de nos apresentarmos maravilhosos, superando todas as nossas limitações, imunes ao risco e anestesiados para o fracasso.
Jogamos as regras universais, tal como as penas do pavão ou o rugido do leão.
Na sedução, o desejo orienta, a razão ilumina e o coração bombeia.
Os sentidos se despertam, o corpo invade-se do poder das hormonas e eleva-se.
Todos os momentos são ávidos de prazer e vividos com emoção.
Conversamos nos olhando, nos conquistando, sorrindo, desejando esse beijo, querendo saborear o gosto salgado e suave dos nossos lábios.
Os teus gestos pedem o toque das mãos que te estendo.
As nossas vozes não falam, mas murmuram ao ouvido estes sons que se só decifram nesta gostosa alienação.
E o cheiro que emanas é a sedução máxima do corpo que quase escondes.
Nesta peça, não interessa transpor a magia, quebrar o encanto e a omissão também não é forçosamente uma mentira.
 

Transformação


 
Fechei a porta deixando tanto para trás, levei apenas o essencial, a minha vida.

Sinto-me agora diante o mar imenso, sem saber ao certo o que fazer. É bem mais fácil o processo destrutivo, tudo é rápido quando se quebram vínculos, traumas ou preconceitos.

Mais difícil é reerguer-nos, definir como juntar todos os pedaços dispersos, como levar em diante esta nova vida, de forma a concretizar tantos sonhos perdidos, reencontrar o amor próprio e dar valor a tudo o que foi já construído, abraçar quem nunca foi esquecido.

Sigo sozinho, pois preciso de conquistar só cada vitória, sei que a minha fraqueza me subjuga aos desejos dos outros. Neste exercício mental, a vida prossegue noutro ritmo, exige respostas, decisões às quais respondemos com emoção quando a razão falha, e vice versa.

E a contradição é a constante humana que nos leva a escolher, a optar. Ela impele-me para a necessidade de partilhar momentos da vida, a solidão cega-nos e seca as emoções e sentimentos. Tenho que aprender também, a gerir a forma como me relaciono, permitir-me de dominar os meus desejos, de impor as minhas regras.

Passo a passo, estou mais forte, mais tranquilo, contento-me com pequenos detalhes, certo que posso errar e falhar. Cresço assim a cada instante, perdoando-me de não ter tentado antes.

Porém, não esqueço os meus valores, sou fiel aos meus princípios e honro a minha palavra. Sei que em nada atrapalham a minha determinação de viver cada instante melhor. Procuro neste guião encontrar respostas dentro de mim. Não deixarei de escutar o coração.

Quero pensar que tenho o privilégio de viver este momento.

 

sábado, 9 de agosto de 2014


Recruto Musas,

 

Tenho Musas a quem sou fiel, mas assumo a minha poligamia literária, nesse mundo de palavras que nunca se esgotam.

Sei também que dedico a todas, cuidados diferentes, pois nenhuma é igual. Trato-as como as flores de quem recolho esse néctar que me ajuda a criar, a sentir a cadência e o ritmo que imprimo nas frases.

Recruto Musas porque quero regenerar, transformar, criar diferente. Preciso de Musas arrojadas, destemidas que ousem me ajudar nesta aventura pelo mundo delicioso da imaginação, do delírio poético.

Prometo me apaixonar nessa cumplicidade que liga o Poeta e a sua Musa, fator essencial à própria criação, razão que alimenta todo o ímpeto e necessidade de pegar na caneta e rabiscar todas essas deliciosas folhas brancas.

O Poeta, tal como o Pintor tem essa necessidade de preencher cada folha, imagina-a completa quando ela ainda está puramente virgem.

Toda a Musa precisa de saber tocar o instrumento com que quiser me seduzir. Eu seguirei a sua melodia e o seu canto ficará gravado nas minhas palavras. O seu nome será sempre recordado, a sua presença enaltecida.

Pagarei os vossos serviços com os textos que vos dedicarei, nos quais vos deixarei coradas de desejo, radiantes de confiança e libertas das correntes que vos amarram à vida normal e entediante.

Espero por vós no meu jardim junto ao lago, ao rio e ao mar onde gostam de se banhar.

 

sexta-feira, 8 de agosto de 2014


Arrependido

 

Nada corrói mais que o arrependimento, quando o sentimento de culpa se torna o balsamo dessa ânsia de vermos minimizado o nosso sofrimento. 

Porém quem sofre é sempre outra pessoa, dos erros que cometemos. Essa impotência de não poder reparar o que está feito, persegue-nos.
 
Basta respirar para falhar, mas tal não nos iliba nem justifica atos precipitados, ímpetos momentâneos. 

O silêncio torna-se a forma mais honesta de aceitar esse pesado fardo, pois a vitima não somos nós. 

O arrependimento transforma-se nesse imenso abismo quando juntamos a confiança eternamente desfeita. 

E o tempo não volta para trás, tomara nunca te ter conhecido, quisera que tudo não passasse desse pesadelo no qual despertarias feliz ao ver que tudo se mantem igual na tua vida.

 

quinta-feira, 31 de julho de 2014



Inquietude

 

Inquieta é a tempestade que se aproxima

Inquietas estão as pernas que não ousam dançar

Inquieto está o coração que ama quando está longe

Inquieto é o sono quando o amanhã se torna presente

Inquieta é a solidão de quem não quer estar só

Inquieto é o formigueiro do pensamento

Inquieta é a justa indignação

Inquietos estão os pais pelos filhos

Inquietos estão os lábios querendo o beijo

Inquieto é o medo de errar

Inquieta é a lágrima que não quer cair

Inquieta é a criança que acaba de nascer

Inquieta é luz frágil dessa vela

Inquieto estou eu quando não sinto



Não guardo memória de tudo o que não fiz,

nem sei mesmo no que me teria tornado,

abdiquei de as sentir, abstive-me de as viver.

 

Fui refém desse arrependimento,

fui infeliz em busca de outras vidas

não vividas, sem saber o que procurar.

 

Criei mundos imaginários, distintos do meu,

num movimento bipolar entre o ser

e o querer.

 

Perdi-me, deixei de entender como tinha

erguido as avenidas que guiavam as minhas

ações.

 

Incapaz de sair do labirinto, desfazer o nó

e desvendar o quebra cabeças, eu me

isolei, não soube comunicar.

 

Vivia um presente esperado, num misto de

desejo e angústia, de alegria e de fúria,

numa dor que sentia e não queria.

 

Não me amei, não permiti que me amassem,

não deixei que invadissem o meu mundo,

não sabia o que mostrar.

 

Sem futuro, algemado à vida, exigi de outros

o que eu não fazia e revoltei-me de mim mesmo.

Não quis morrer assim.

segunda-feira, 28 de julho de 2014


Prazer, Natália


 

A noite termina e tu apareces

com a tua seriedade que me cativa.

trazendo contigo a cobrança,

dos bons momentos.

 

O teu sorriso é contido,

pois carregas em ti,

o peso dessa responsabilidade.

 

Passas a noite na sombra,

na tua discreta elegância

que eu admiro em silêncio.

 

Passas por entre as mesas invisível,

pois a noite é das estrelas

e trazes o dissabor da realidade.

 

Creio que gostas desse poder,

que representas tão bem.

A tua presença é bem vinda

na minha mesa.

 

Maria

 

Maria era uma mulher como tantas outras. Sofria, não amava e não era amada. Perdera os seus sonhos com o passar dos anos. Sobrecarregada em trabalho e filhos esquecera dela mesmo.

Em silêncio mantinha rotinas, escondia desejos, vivia fetiches. Tinha vergonha, pensava ser a única e não partilhava segredos. Refugiava-se na sua dimensão, nesse espaço sentia-se melhor vivendo por outros, por vezes meras ficções, personagens de livros.

Passava na rua, cabeça para baixo e sempre em passos rápidos. Tinha medo de olhar e ficar fascinada com um mundo a que não chegava e nunca vivera. Tinha vontade dessa paixão que sabia existir, que lera e ouvira. Queria ser beijada, idolatrada, possuída como nunca ousara pedir.

E o desejo é como a dor de dente, não se cura somente com muita vontade. Tem que se pôr a mão, enfrentar, realizar. Maria ousou, provou e não desgostou. Sentiu-se mulher, amada e desejada.

Depois veio a culpa, o receio e a recusa de enfrentar novamente aquela vida. Não queria voltar para a sombra depois de ter visto a luz, de ter sentido o chão tremer por baixo dela. Maria não podia ser feliz, não era certamente o seu destino. Só, Maria se jogou sorrindo daquela ponte...